Quando converso com pessoas de cidades distantes ou de outros estados, pessoas que desconhecem minha localização atual, e falo que sou de Taubaté, a resposta quase sempre é a mesma: “Ah, é a cidade da grávida!” Mas o que isso realmente representa?
A grávida de Taubaté nos faz refletir sobre a credibilidade e a manipulação da informação. Como alguém conseguiu enganar tanta gente por tanto tempo? Isso nos leva a pensar em como estamos vulneráveis às narrativas que nos cercam, especialmente em tempos de fake news.
E falando em desinformação, vamos olhar para a política local. Tantas incoerências cometidas por diversos políticos nos últimos anos e, neste momento, o atual presidente da Câmara de Taubaté se diz a favor da liberdade de expressão, mas critica conselhos, chamando-os de “coisa de comunista”. Isso é um cinismo extremo! Como podemos discutir liberdade de expressão se há uma resistência em ouvir diferentes vozes e opiniões? Observando alguns políticos de Taubaté e fazendo um paralelo com a grávida de Taubaté, percebo que é, de certa forma, injusto essa fama da grávida, perante a sua relevância e seu amadorismo em uma cidade com tantos atores profissionais fingindo ser políticos! O professor Silvio Prado escreveu uma análise histórica e contemporânea do racismo na cidade de Taubaté.
UM POUCO DA LUTA CONTRA O RACISMO EM TAUBATÉ
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“Em maio de 2022, o prefeito José Saud, acatando a reivindicação de inúmeros militantes antirracistas da cidade, encaminhou para a Câmara Municipal um projeto que propunha criar o Conselho da Igualdade Racial no município.
De maio de 2022 até o presente momento, transcorreram 18 meses e, conforme se verificou na última sessão da Câmara Municipal, no dia 17, mais um ano legislativo terminou sem que o projeto fosse discutido e votado.
Portanto, um projeto importantíssimo para fazer avançar a luta antirracista na cidade, depois de inúmeras manobras feitas pelo presidente da Câmara, vereador Alberto Barreto, o projeto termina o ano dormindo numa das gavetas da Comissão de Justiça da casa de leis. Das vezes em que o projeto entrou na pauta para discussão e votação, foi retirado para contemplar emendas feitas pelo vereador e, quando saiu, não retornou com a mesma pressa.
Na sessão do dia 17, a última do ano, vereadores que defendiam o projeto ocuparam a tribuna e denunciaram Alberto Barreto. A vereadora Talita Cadeirante, com todas as palavras necessárias, chamou-o, por mais de uma vez, de racista. O vereador Douglas Carbone fez o mesmo. Num resumo das duas intervenções, ficou claro que, nesses 18 meses, Alberto jogou de todas as maneiras para impedir a discussão e votação do projeto.
Também, no decorrer desse tempo, por várias vezes, o vereador-presidente falou coisas criminosas sobre o Conselho. Ele não teve o mínimo escrúpulo ao dizer, numa sessão da Câmara, que não gosta de conselhos e que, no caso do Conselho da Igualdade Racial, os negros não passam de supremacistas. E mais: que conselho é coisa de comunista. Meses atrás, ele usou uma sessão ordinária para passar um vídeo em que debochava e ridicularizava os militantes negros e antirracistas. O vídeo é completamente desrespeitoso e segue a linha de vídeos produzidos pela conhecida produtora Brasil Paralelo.
O caso aqui debatido expõe, sem nenhuma censura o racismo de uma cidade que se orgulha de ter sido polo irradiador do bandeirantismo, pouco importando se essa gente selvagem tenha dizimado milhares de indígenas em todo o Brasil e, sob fogo das tropas mercenárias de Domingos Jorge Velho, Palmares tenha sido destruída e, como todo mundo sabe, Zumbi assassinado. Assassinos bandeirantes ocupam nomes de ruas, avenidas e escolas taubateanas. A história oficial tem sempre espaço para a glorificação dessa gente. Na ditadura, uma das avenidas da cidade, que tinha como nome uma palavra de origem indígena, deu lugar ao nome Faria Lima, um oficial brigadeiro da Aeronáutica e ex-prefeito de São Paulo.
Taubaté é também a terra onde José Bento Lobato escreveu livros infantis e obras adultas recheadas de passagens racistas. Por aqui, pouquíssimas pessoas fazem críticas ao escritor e nem de longe vinculam seu nome aos eugenistas do início do século XX e à ideia escandalosa que Lobato teve ao dizer que no Brasil faltou uma Ku Klux Klan para colocar o negro brasileiro no seu devido lugar. Numa das entradas da cidade está escrito, em homenagem a Lobato, “Taubaté, capital da literatura infantil”. Uns trezentos metros longe dessa inscrição, encontramos uma estátua do escritor. Também não muito longe, pode ser vista outra estátua, está bem maior e mais imponente, homenageando os chamados bandeirantes.
Somos o município que, na sua Rodoviária Velha, mantém um painel com 34 quadros dando destaque ao que “a cidade tem de melhor em sua história.” Naquele painel cabe de tudo, menos o rosto e a história de um negro ou indígena.
Os exemplos e fatos aqui colocados servem para mostrar que o protagonismo racista do vereador Alberto Barreto não aconteceu de improviso ou por inocência. Ele faz parte e expressa um setor significativo de uma cidade que já foi capaz de, em anos recentes, manter hasteada na sua praça principal uma bandeira do Império e, só mesmo com a intervenção da Defensoria Pública, a mesma foi retirada pela prefeitura.
Conter o avanço da luta popular e da luta contra o racismo está na ordem do dia para as classes dirigentes do país inteiro. Para nós, taubateanos, o ano vai começar com o compromisso de, enfrentando o racismo, pressionar vereadores para a aprovação da lei que cria o Conselho da Igualdade Racial, importante instrumento de luta, já sabendo que, nos quatro anos que virão, a cidade se encontrará sob o comando de um prefeito do chamado Partido Novo, outro agrupamento político que, já está provado, de novo só tem apenas o nome”.
Silvio Prado.
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